domingo, 31 de julho de 2011

Sonhos de uma noite de inverno

Dizem por aí que dia 15 foi o Dia do Homem. Para comprovar que não faço só mau juízo dos meus irmãos de espécie, não vou dedicar apenas um dia, mas todo o mês de julho a eles, os de Marte. Encerro o mês com esta singela homenagem.

Das tipologias masculinas: o Tipão
Certa noite dessas, cumprindo meu compromisso comigo mesma de não sucumbir à falta de vida social, fui a um desses botecos/bares/pubs da vida. Acho que ninguém acredita naquela frasesinha “só vim para dançar” ou, no caso dos pubs, “tô só pelo drink” (by Alinão). Hoje em dia, ou melhor, em noites, apenas um-noventa-e-nove-avos dos seres humanos não vão para a noite para ficar girando o pescoço em 367° feito lêmures loucos, num ritual que concretiza o popular “tiroteio”. Pois bem, faço parte deste seleto e desacreditado grupo que vai para a “night” sem pensar necessariamente em achar ali uma pantufa (agora, que o inverno medonho chegou) ou um scarpin na estica para sair desfilando por aí.
Vide companheiros de faculdade, freqüentadores do saudoso boteco Bolicho, hoje uma farmácia (se precisar de Eno, agora tem à vontade!): enquanto todos iam para lá e de lá saiam em pares já formados, Freconildas de lá voltava como chegava (ok, 86% das vezes); enquanto os demais se abraçavam nas garrafas de ceva (vendidas a módicos R$1,50!), Freconildas lá estava abraçada em sua clássica garrafa de inox, goleteando um chima veio (Carry, a estranha). Bem, nada mudou muito da graduação para cá: troquei o chimas pela água gelada (acho que serei socialmente banida se entrar com uma térmica num pub) e continuo na sociabilidade passiva, sem incorporar o estilo lêmure de ser.
Digressões à parte, naquela noite de melll delzzz, uma serelepe amiga chamou minha atenção para uma pessoa discreta. Um homem, muito próximo à nossa mesa: aquele transeunte não sabe da minha existência, jamais pensaria que habito a mesma galáxia que ele e sequer pensaria que eu o observava. Mas ele me fez querer prestar uma homenagem aos demais de sua classe, a quem agradeço pela existência...
Ele não é bonito, é um feio interessante, de traços sisudos. É a personificação da cruza dos feromônios do Zé Mayer, com os músculos do Dourado e o rosto do Gerard Butler. Ele é rude.
Caminha como se não houvesse nada à sua frente, sem ao menos mover involuntariamente as pupilas na tua direção. Ele rasga os caminhos, os demais que o sigam. Faz carinho quase que com a mão fechada, e quando abre é para puxar os cabelos da mulher. Ele não fala, mas sabe como olhar de uma forma que a mulher se sente completamente nua em público. O Tipão não abraça, puxa. Não pega no colo, levanta teu corpo como se fosse uma pena, a la Vin Diesel. Fala pouco, mas diz tudo em sete palavras. Ele não pergunta, faz.
O Tipão não sucumbiu às boas maneiras, mas uma vez a cada 91 anos, quando Vênus, Júpter e a Lua alinham-se, ele te surpreende com flores. Ok, com um botão de flor...
Este ser tosco, bruto, sério, tem um humor seco, ácido, cortante. Não ri de piadas, apenas levanta o canto da boca, em um breve momento no qual esboça simpatia pelos demais. Não dança nas festas, espreita as mulheres enquanto coloca um pé pra frente e outro pra trás – muito sutilmente. A roupa que ele usa na festa é a mesma que veste no dia seguinte para correr ou para trabalhar: ele não pensa que é uma roupa, vê apenas uma sobreposição de panos. Para o Tipão, as cores reduzem-se ao preto, branco, verde, amarelo, vermelho e azul – e “combinação” é uma palavra inexistente em seu mundo; aliás, listras e xadrez são sinônimos para ele. Ele não sabe e não quer saber o que é design. Ele nunca chorou vendo um filme. Ele não conhece os diminutivos.
Mas, vez que outra, o Tipão mareja os olhos – num esboço de choro. São raros os momentos em que é possível observar esta espécie aos prantos. Mas não se iluda, ó Nobre-camponesa-que-vai-todos-os-dias-ao-bosque-recolher-lenha: isso é apenas seu golpe final. É a parte mais afiada da lâmina de seu robusto machado: vai cortar seu coraçãozinho em milhares de farpas e, quando menos tardar, estarás apaixonada pelo Tipão. Afinal, todo mundo sabe que homem grande chorando é golpe baixo... mas a gente gosta!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Achei triste o uso das reticências

Dia desses externei uma coisa que já tinha pensado, e sobre a qual já tinha chegado à conclusão há algum tempo... Conversei sobre a forma como as coisas findam.
Aos nove anos, fiz uma amiguinha em uma situação peculiar. Na época em que conseguir uma linha telefônica era luxo, também era moda criança passar o dia pendurada no telefone dando trote. Ligava para um número qualquer e, onde caísse a ligação, aplicava o trote do carro gelo, da família Pires, e por aí vai. Um dia, a Jordana ligou pra minha casa e ficou passando trote. Os trotes eram tão engraçados e ela era tão figura que começamos a conversar e ficamos amigas: amigas de telefone. Passamos a nos ligar diariamente, a nos escrever cartinhas – na época, também se escrevia carta, comprava-se selos e se postava no correio... sim, tenho rugas. Não lembro do exato dia em que não nos ligamos e, daí em diante, que passamos a não nos ligar mais, nem a escrever em papel de carta perfumado uma para a outra... E o tempo passou. E a Jordana passou.
Na mesma época, eu tinha uma amiga muito querida, que morria de ciúmes desta minha relação telefônica! Sempre que nos perguntavam se éramos irmãs (porque andávamos sempre juntas), nós dizíamos: “não, somos vizinhas, colegas e amigas”. Resposta completa. Foram anos de convivência não somente entre nós duas, mas entre nossas famílias. E, mesmo com a distância que a “adultice” às vezes traz em relação às pessoas queridas, foram anos ainda compartilhando fases da vida por telefone, por e-mail, por visitas cheias de saudade. O tempo passou, ela casou, teve filho... Paramos de nos ver, de nos falar. Não sabemos mais do quotidiano uma da outra, não sabemos mais dos medos, das conquistas, dos problemas, das alegrias. E a vizinha-colega-amiga também passou.
Não sei dizer se sou amiga de todos aqueles a quem um dia chamei assim. Não deixei de gostar de ninguém, mas as circunstâncias, o tempo e a forma como a vida passa por nós, por muitas vezes, me fazem pensar o que determina o momento em que “decidimos” não mais partilhar nosso “eu” com outra pessoa. Não deixamos de gostar, apenas deixamos...
Perdi as contas de quantas vezes saí com alguém e pensei que ficaria mais tempo com aquela pessoa. Não me refiro necessariamente a namoro, porque hoje em dia se tu falas que sentes saudades, pronto: já pensam que estás com o tipo de papel dos convites de casamento encomendados! Como se não houvesse mais espaço para o afeto despretensioso. Não. Não falo necessariamente de namoro, mas de um período bom o bastante para sair com alguém e saber se essa pessoa te faz bem. Se vocês se fazem bem.
As conversas boas, a companhia agradável, bom humor na relação (imprescindível), mesma fase de vida, boa química... Simplesmente bom. E não sei dizer, na maioria dos casos, o que determinou o momento em que cada um de nós foi para lados diferentes. Tem o fenômeno do “nojinho”, que mais cedo ou mais tarde vai bater à tua porta: ou tu vais pegar nojinho de alguém, ou, acredite, este alguém vai pegar de ti (ou tu achas que só tu vês defeitos nos outros?). Mas, em muitos casos, não é isso que acontece: nenhuma briga, ninguém usou palavras ríspidas, não houve demonstração de cobrança, vocês não começaram a sair com outras pessoas. A distância apenas veio. Pessoas que compartilharam momentos extremamente íntimos e bons apenas deixam de se falar e se tornam estranhas. As pessoas passam.
Acho isso triste.
Já pensava nisso há algum tempo, mas esses dias, ao falar em voz alta pra outra pessoa e pra mim mesma, achei mais triste. A palavra pronunciada teve mais peso do que a palavra pensada. Percebi que certas situações tem um ponto final que, de alguma forma, te reconforta mais, por saberes o início, o meio e o fim de tudo. Principalmente por poderes enxergar, com clareza, o fim. Outras situações apenas te apresentam reticências.
Algumas coisas terminam. Outras, simplesmente acabam...

A maneira mais alegre que eu já vi para se cantar um clássico triste.