sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Festa em família: diversão tão garantida como arrancar um siso

Aaaahhh, o verão... é também época de Natal, aqui para nós, latinos. Aqui para mim, integrante da Família Buscapé, é tempo de encontros consangüíneos. Por essa época já me preparo psicologicamente.
Escapo-me dos encontros familiares mesmo nos aniversários, nos churras de final de semana, nos almoços pré-morte de algum tio mais velho, mas final de ano não tem jeito: é festa na lage.
Muita criança ranhenta correndo com material de construção na mão, cachorros de todas as raças em si mesmos ao redor da mesa e atacando loucamente cada convidado que chega, pessoas que tu supões serem teus parentes brotam, não se sabe bem de onde, em ordas... e a comilança, claro: - serve mais um pouquinho, minha filha, tá tão magrinha, come, come!!
Quando a nanotecnologia servir para leitura de pensamentos, não mais terei família, pois na primeira reunião meus parentes irão sangrar até a morte devido ao rompimento dos tímpanos, causado por meus gritos de horror durante as horas que se passam nas comemorações Dó-Ré-Mi. Meus pensamentos costumam ser meus únicos amigos nesses dias “festivos”. Não creio que nenhum amigo do mundo físico queira me acompanhar na empreitada, mas já pensei em usar o artifício para espantar uns caras aí... É de se levar em consideração.
Não sei por qual motivo, mas pessoas da nossa família parecem ter um repertório feito, decorado, friamente armazenado no congeladorzinho cerebral deles, pronto para ser desinformado quando tu chegas à reunião familiar. Ou melhor, quando todos já chegaram e podem ouvir e compartilhar os momentos de infortúnio e constrangimento entre perguntas insolentes e respostas monossilábicas.
Por que as perguntas são sempre as mesmas? Por que aquela sua prima que não gosta de ti finge que a tua visita é a mais esperada do ano? Por que não deixam o teu tio dormir ao invés de sacrificá-lo à mesa, ouvindo as mesmas histórias de doença das tias? Por que a mãe do marido da tua prima-irmã grita tanto, sendo que ela está falando com a cunhada do teu primo, que está sentada ao lado dela?
Essas cenas gloriosas me motivam há anos a construir um repertório de diálogos que um dia ainda hei executar. Num dia em que certamente israelenses e palestinos irão chorar abraçados de felicidade pela coragem de uma destemida criatura, que do alto de seus 47Kg ousou enfrentar as tropas Buscapé.
Um dia perfeito:
Tia n°1 pergunta: - Minha filha, não vais comer mais? Tá tão magrinha, não comeu nada! Come aqui a salada de batata, com arroz, com maçã, com galinha desfiada e com figo, que a tia fez!
Resposta: - Ah, tia, na verdade eu já comi; sabe aquela hora que eu saí um pouco da mesa? Então, eu fui vomitar no banheiro. Por isso estou tão magrinha assim, vomito direto! Agora vou economizar a garganta para a sobremesa, se a sra. não se importar.
Tia n°2 pergunta: - Mas então, querida, tão bonita! Sempre parecida com a mãe. É a cópia escarradinha da mãe, tu não achas?
Resposta: - Então, tia, melhor ser um cuspe da mãe do que ser o cocô de um monte de pais diferentes, que nem os teus filhos, a sra. não acha?
 Prima n°1 pergunta: - E aí, prima, tá naquele emprego ainda? Aquele, que tu tava... fazendo... que tu faz  mesmo, prima?
Resposta: - Então, prima, ao invés de ti, que optou por não estudar, ter uma vida suburbana, trabalhar em dois empregos medíocres, casar para não ficar mal falada, engravidar por pressão da família e viver no cu do mundo, eu preferi estudar e agora dei um tempo no trabalho formal para ser garota de programa, juntar alguns milhõezinhos para depois viajar mundo afora. Te aconselho, viu?!
Primo pergunta: - Mas e então, prima, quer puxar a oração pra nós, antes de nos servirmos?
Resposta: - Não, primo, obrigada pelo convite. Sou adoradora de satã, acho que vocês não gostariam do meu tipo de oração. Mas, por via das dúvidas... tem uma cabra aí? Bode também serve.
Prima n° 2 pergunta: - Eeeee, ô prima: quando é que tu vais trazer um primo bonito aqui pra nos apresentar? Uma guria tão bonita que nem tu, aí, solteira... está na hora de nos apresentar um marido!
Resposta: Então, prima... até andei pensando nisso, mas como no ano passado eu estava dando pra vários, fiquei em dúvida sobre quem trazer, não achei justo beneficiar apenas um convidando para vir aqui nesta maravilhosa confraternização, e acabei não trazendo ninguém. E, nesse ano, como virei lésbica, não sabia se vocês estavam prontos para receber minha nova namorada, mas já que tu tocaste no assunto...

Ai, ai... sonhar não custa nada!!!

O fato é que tu é o único sem responsabilidade, sem família. Tu é o único que vive sozinho.
Mas eu não vivo sozinho; há dez anos que moro junto.
Mas por que o segredo conosco? Há dez anos sai com uma moça e não nos diz nada?! Quem é, o que faz, como se chama?
Se chama Mario. E faz Vigilantes.