quarta-feira, 29 de junho de 2011

Da série tipologias masculinas: o Pouca Coisa

Sabes que estás diante de um Pouca Coisa quando pensas – ah, como eu queria o Joseph Climber aqui! Sim, porque antes um peso de papel, com uma utilidade prática nesta vida, do que um Pouca Coisa.
Nosso protagonista é bonitinho. É engraçadinho. É educadinho. É queridinho. É inteligentinho... é “inho” demais para uma única pessoa! Nada nele é “ão”. E nada nele é “nada” também, o que torna a relação de vocês extremamente difícil. Porque mesmo naqueles momentos psicóticos em que tentas achar um motivo para uma briga, perdes toda a autoridade quando ele te faz um carinho, acompanhado de um sorrisinho... Como maltratar alguém tão atenciosinho? Maldito PC, que não te deixa brigar com ele!
Ele tem tiques que, aos olhos dos demais transeuntes, passam despercebidos. Sentes um solavanco da insanidade à tua porta toda vez que perguntas o que teus amigos acham dele e tens como resposta – nossa, muito gente boa. Mas és tu, ó sofredora criatura, que convives com aquela mania dele de dizer “por causa qui” ao invés de “porque”; ou com aquele cacoetezinho que ele tem de te cutucar na boca do estômago quando estás prestando atenção em um filme... ah, Climber, bendito sejas!
Mas, ainda assim, ele te faz rir. Vocês conversam muito. Fazem boas caminhadas juntos, contemplando a paisagem, conversando, perdendo a hora... Passam horas falando, falando, falaaaando... sobre absolutamente nada que te desperte interesse em longo prazo. PC daria um bom amigo. Aquele a quem podes xingar como a um irmão, com quem podes andar sem ter a obrigação de dar a mãozinha ou fazer zoínho, aquele que procuras para sair uma, duas vezes por mês para manter o grau de sociabilidade no nível da normalidade... mas não. PC está convencido de que és a encomenda das Portas da Esperança! E ele não deixa por menos: tenta te convencer de que vocês têm (até 2012 tô usando o acento, Lula!) química.
Nas preliminares, PC faz seu papel direitinho. A finalização, como não poderia ser diferente, é o cerne do tema. O que dizer para a situação de “pouco”? Claro que PC tem desculpas na ponta da língua – isso quando as profere –, pois já é magistrado no quesito de “pouquidão”: 1. é culpa da camisinha, perco a sensibilidade; 2. está um pouco frio; 3. não estou bem hoje; 4. daqui a pouco melhora, vamos brincando; 5. tu não estás no clima, né? Esta última é para fazer até Gandhi interromper a greve de fome e sair matando boi a tapa. Após utilizar um de seus argumentos, PC diverte-se sozinho... faz tentativas incessantes para tornar-se a reencarnação de Leônidas, quando, na verdade, o que ali está não faz nem a trilhonésima fração das sombras das flechas de Xerxes! Isso! Leônidas. Vamos pensar nele enquanto isso... aquele abdômen, aquela barba, o jeito rude... Passam-se alguns minutos e retornas do teu mundo de depravação devaneio fuga distração, olhas para o lado, meio de revesgueio, PC e PC Junior estão ali, divertindo-se AINDA. “Incomodo vocês? Se quiseres, posso sair e deixar os dois a sós.” Quem nunca teve vontade de levantar da cama e perguntar isso?! Em certos momentos me pergunto se o respeito teria ficado em casa junto com a atuação favorável da gravidade. Mas o que fazer com PC?!
O fato é que com o nada nós sabemos como lidar. Para o nada o roteiro está pronto. Para o nada também já temos as respostas na ponta da língua: 1. Tudo bem, acontece; 2. Não tem problema, acontece; 3. Sem stress, acontece; 4. Não tem importância, acontece; 5. Eu sei... às vezes acontece. Agora, para a poucacoisice não se sabe ao certo o que dizer! Como diz uma amiga minha, nessas horas cabe a analogia do Danoninho: quem não gosta de um bom potinho, não é? Mas todo mundo sabe que é pouco! Agora, imagina só meio potinho de Danoninho: o que fazer com isso?!
O fato é que nessas horas de pouquidão, muitas vezes, nem se pode fazer uso das palavras, pois é bem capaz de PC ficar insultado! Não tem nada de errado acontecendo ali! Por que falar qualquer palavrinha de consolo que seja? Estás louca, mulher?!
...Esses dias achei um antigo peso de papel nas minhas coisas. Coloquei na estante para dar suporte a um livro... não lembro o título, mas abri, aleatoriamente em alguma página e li: “A alegria está na luta, na tentativa, no sofrimento envolvido. Não na vitória propriamente dita”. Liguei pro PC para ver como ele estava... Marcamos de sair na semana seguinte. Assistimos ao filme 300.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Toda criança é um pouco gótica

Eis minha contribuição para o dia 12.
Rafael Dias era o nome dele. No primeiro dia de aula, entrei faceira, que nem guaipeca “arrodeando” o rabo, ainda mais quando a Professora Denise disse: - mááás, e quem é essa guria de cabelão lindo?! Todos sentados, em roda, apresentando-se um a um. E ele, na minha frente – obviamente, a roda organizava-se no esquema meninas de um lado, meninos de outro. Ele, com seu cabelinho liso em corte cogumelo, narizinho arrebitado e olhar do tipo “vou crescer e dar um trabalho pra mulherada, que não vai ter nem graça”. É de pequeno que tu identificas se o guri vai ser pegador ou não. Sei lá se tem a ver com o DNA, mas tu olhas pro piá e já sabes se terá a mãnha ou não. Cá entre nós, tem uns que chegam a nos dar pena da nossa própria idade. Ai, que vontade de cultivar algumas espécies para o futuro... Abafa e foco.
Enfim, anos se passaram e seguíamos colegas. Nunca fui uma menina que só brincava com meninas, que não se sujava ou que só sentava na frente, juntinho da profe. Sempre fui amiguinha dos guris e das gurias ao mesmo tempo. Também não era daquelas que jogava futebol com os guris, que nem a Raquel da 6ª série. Mas sempre me dei bem com eles. Com o Dias (como era conhecido, já que Rafael deveria ter uns três na sala), nunca consegui estabelecer uma amizade. Mas sempre quis. Aliás, queria mais do que uma amizade: páginas e páginas do diário (aquele com a chavezinha) preenchidas com corações que abrigavam o meu nome e o dele. Choros incontidos em momentos diversos, pensando no meu amado. Noites de sono agitadas pela imagem daquele meu colega de aula, que sentava lá do outro lado da sala. Meu amadinho não era só mais um no colégio, para aumento de minha penúria: era o mais popular da série, não tinha quem não o achasse um gatinho!
Somente uma coisa separava o Dias da perfeição: torcia por um time oposto ao meu. E, para o azar dele, torcia pelo time da minoria da sala. Isso às vezes era um problema maior do que se pode imaginar: geralmente, nas partidas de futebol – em que eu e as gurias fazíamos coreografias de Paquitas para animar a torcida -, quando saía discussão, o Dias levava a pior por ser do time da minoria. Leia-se: apanhava. E eu, nunca sabia que partido tomar! Muitas vezes assisti meu amado chorando, no cantinho da sala, abrindo o potinho do lanche com aquela nega maluca, sozinho, soluçando... E eu lá, dividida entre os amigos e o amor! Ó, destino triste desta errante mirim! Mas, popular que era, o Rafa (como eu tomava a liberdade de chamá-lo às vezes, ruborizada) sempre fazia as pazes com os coleguinhas e tudo ficava bem.
Conformava-me já com o fato de que aquele semi-deuzinho jamais seria meu par. Nem deveria saber meu nome direito, era muita oferta naquele colégio, ele podia escolher. Por que escolheria a mim? Melhor ficar resignada, escrevendo no diário, sonhando, imaginando cenas romantiquinhas, enxugando as lágrimas grossas e assoando o narizinho vermelho.
Quando digo que tive uma infância feliz, parte disso deve-se também ao Dias. Certa feita, Papai do Céu olhou para baixo e disse: “tá, gótica mirim do inferno, toma o que te mandaram!”, e, não sei em que dia da semana, em que aula e nem por qual ocasião, os guris me deram a notícia de que o Rafa me considerava a namorada dele. Ah, como é bom ser amiga dos guris!
Depois daquele dia, não me lembro de ter falado com o meu amadinho, mas isso não tem importância nenhuma dentre as minhas memórias da infância: o que ficou foi a lembrança quase física do meu coração disparando, do meu sorriso incontido, da minha tentativa de controlar o riso e da caminhada até as gurias, para repartir a mais nova novidade novinha do momento! Eu tinha um namoradinho, e era o Rafa! Te mete!!
Realmente não lembro dos dias subsequentes, mas sei que o Rafa saiu do colégio antes de mim. E, apesar de sermos vizinhos, não nos encontrávamos pelas ruas do bairro. Não sei se isso configurou o término do nosso namoro, mas eu ainda fui fiel a ele por algum tempo. Depois dele, veio o Fandangos, um guri mais velho, também popular na escola, e me lembro, como se fosse hoje, da minha faceirice quando descobri que eu era a segunda na lista de preferências dele, dentre todas as outras gurias do colégio! Nossa, eu era a segunda! Só precisava matar uma e eu era a próxima na lista! Ops, acho que falei isso alto... Enfim, essa já é outra história.




Agradecimento especial à pessoa querida que me mandou este vídeo.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Pensei bem e... quero ser super-heroína

Percebo alguns anseios gerais entre meus amigos cuja faixa etária equipara-se à minha: sair de casa (se já não saiu), pagar as contas sozinho, ter/manter um carro, subir na profissão, conhecer alguém especial, manter um bom relacionamento, constituir família (com os mais variados tipos de configurações), e, enfim, ter uma vida estável, podendo-se dar ao “luxo” de viajar, comer bem, ir a lugares interessantes, etc. Os anseios variam de ordem de acordo com a classe, os pilas na conta bancária, a vida afetiva... mas, via de regra, fazem parte do pacote básico do ideal de vida feliz.
Certa feita, nesses dias frescos aqui do Sul, algumas amigas e eu conversávamos sobre quem gostaríamos de ser se pudéssemos escolher uma heroína. Tentávamos lembrar os nomes, quando algumas personagens eram mais antiguinhas. Incorporamos os personagens, achamos características físicas umas nas outras para justificar a escolha, analisamos e medimos as utilidades dos poderes, contextualizamos os desenhos em que apareciam, e, por fim, cada qual teve sua heroína eleita. Fácil assim. Questão de uns 20 minutos – depois, outra pauta sentou-se à mesa conosco, naquele ritmo frenético de assuntos femininos que todos nós já sabemos como funciona.
Não entendo o que ocorre na vida real, que a torna tão difícil ante a vida das heroínas: a Shee-ra, por exemplo, era de uma família real e morava em um castelo; mas não era qualquer castelo, era um de cristal – leia-se que não precisava trabalhar, pois tinha grana, mas muita grana mesmo! Mesmo assim, ela trabalhava por gosto, e não escolheu qualquer trabalhinho: ela lutava contra o mal e, em todos os episódios, vencia o Hordak! Ela não ganhou apenas um pônei de seu pai quando era pequena: ela tinha o Ventania. Era dona de uma aparência impecável. Dava-se muito bem com seu primo gay. Todo mundo gostava dela. Podia ter dupla personalidade sem ser considerada uma bipolar. Salvava Ethéria e ainda tinha tempo para fazer as unhas!
Quando eu tinha uns quatro anos, fui personagem de um episódio histórico em família. Caí na piscina e me afoguei – em tempo, essa foi apenas uma das muitas vezes que me afoguei. Vi a morte bem de perto. Não tive medo, não tentei sair da piscina, não me passou um flash da minha breve vidinha na cabeça, não pensei nos entes e nos amiguinhos queridos, nada além do cloro nos pulmões me fazia companhia naquela hora. Salva por um familiar, após chorar, tossir, tomar banho e tentar explicar (em vão) que eu havia escorregado, e não tentado me matar, fiz um pedido bem simples à minha irmã, enquanto ela me secava após o banho: - posso usar uma roupa de Shee-ra? Ela, sem proferir uma palavra sequer, balançou a cabeça positivamente, mas me vestiu com uma roupa qualquer, uma roupa minha mesmo. Vê-se bem que era adepta da terapia do Analista de Bagé, a consanguínea...
Não discuti. Não teimei. Não pedi novamente para ser a Shee-ra. Quem sabe porque, já ali, eu tenha começado a entender que minha vida seria mais fácil se eu não tivesse que salvar um planeta todos os dias. Mas, ainda hoje, penso que talvez eu acharia mais soluções tentando salvar um mundo inteiro, do que tentando construir as coisas simples desse tal pacote da felicidade pra minha própria vida.

Minha fantasia realizada: by Lizandrinha